Com o advento da reforma da lei de falências e recuperação judicial, através da Lei nº 14.112/2020, uma série de alterações entraram em vigor neste ano.
Dentre as alterações de maior destaque, vale citar a proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência. Tal proibição está prevista no art. 6º da Lei nº 11.101/20115 (lei de falências), inciso III.
É uma alteração substancialmente importante, a medida em que impede que bens que compõem o patrimônio do devedor venham a ser atingidos por atos de outros processos e, através de leilões ou outro ato de expropriação, deixem de pertencer ao devedor, imprimindo prejuízo não só a este como a todos os outros credores.
Foi dispensada a apresentação da chamada CND para operações que envolvam o exercício das atividades do devedor e proibida a distribuição de lucros ou dividendos até que seja aprovado o plano de recuperação judicial.
É sabido que durante o processo de recuperação judicial, há enorme dificuldade prática dos devedores celebrarem contratos de financiamento, até porque, qualquer operação que envolva ou ponha em risco o patrimônio do devedor fica proibida enquanto perdurar o processo. Com a reforma da lei, depois de ouvido o Comitê de Credores, será possível celebrar contratos de financiamento pelo devedor, garantidos pela oneração ou pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não circulante, para financiar as suas atividades e as despesas de reestruturação ou de preservação do valor de ativos.
Também vale mencionar que os produtores rurais passaram a ter a possibilidade de fazer uso da recuperação judicial para os seus negócios.
Os casos de grupo econômico não são novidades na seara empresarial. E a recuperação judicial não foge dessa realidade. O que a reforma fez foi detalhar como isso se dá ao longo do processo. Para tanto, dividiu o tema em consolidação processual e substancial.
A primeira (consolidação processual) foi prevista no art. 69-G a I e significa a mera “coordenação de atos processuais, garantida a independência dos devedores, dos seus ativos e dos seus passivos”.
Já a consolidação substancial (art. 69-J a L) prevê:
Art. 69-J. O juiz poderá, de forma excepcional, independentemente da realização de assembleia-geral, autorizar a consolidação substancial de ativos e passivos dos devedores integrantes do mesmo grupo econômico que estejam em recuperação judicial sob consolidação processual, apenas quando constatar a interconexão e a confusão entre ativos ou passivos dos devedores, de modo que não seja possível identificar a sua titularidade sem excessivo dispêndio de tempo ou de recursos, cumulativamente com a ocorrência de, no mínimo, 2 (duas) das seguintes hipóteses: (Incluído pela lei 14.112, de 2020) (Vigência)
I – existência de garantias cruzadas; (Incluído pela lei 14.112, de 2020) (Vigência)
II – relação de controle ou de dependência; (Incluído pela lei 14.112, de 2020) (Vigência)
III – identidade total ou parcial do quadro societário; e (Incluído pela lei 14.112, de 2020) (Vigência)
IV – atuação conjunta no mercado entre os postulantes. (Incluído pela lei 14.112, de 2020) (Vigência)
Nesta última hipótese, “ativos e passivos de devedores serão tratados como se pertencessem a um único devedor” (art. 69-K).
Outra previsão que, embora não constasse no texto da lei 11.101/2005, era de aplicação normativa através de outros textos de lei é a questão da desconsideração da personalidade jurídica. Conforme a reforma dada pela lei 14.112/2020:
Art. 82-A. É vedada a extensão da falência ou de seus efeitos, no todo ou em parte, aos sócios de responsabilidade limitada, aos controladores e aos administradores da sociedade falida, admitida, contudo, a desconsideração da personalidade jurídica.
Além da apresentação do plano de recuperação pelo próprio devedor, a nova lei trouxe a hipótese de apresentação do plano também pelos credores. Assim, rejeitado o plano de recuperação judicial, o administrador judicial submeterá, no ato, à votação da assembleia-geral de credores a concessão de prazo de 30 (trinta) dias para que seja apresentado plano de recuperação judicial pelos credores.
Não obstante, outra novidade é a previsão de parcelamento fiscal em até 120 vezes e a possibilidade de “liquidação de até 30% (trinta por cento) da dívida consolidada no parcelamento com a utilização de créditos decorrentes de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) ou com outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil” (art. 3º da lei 14.112/2020).
Fica evidente que houve um aperfeiçoamento da lei de falências e recuperação judicial, buscando-se tornar esse instrumento mais acessível e dinâmico para o meio empresarial.