É inevitável que os efeitos da atual situação do país, com o isolamento da sociedade, provoquem alterações econômicas substanciais nas relações contratuais, em especial as locações.

A grande maioria das empresas, sejam produtivas, comerciais ou prestação de serviços, estão estabelecidas em imóveis locados. Com o total desequilíbrio da normalidade e do dia a dia da sociedade brasileira, tornou-se inevitável o reflexo no faturamento e, por consequência, na capacidade econômica de liquidação de débitos, entre eles, o aluguel.

A locação decorre de contrato, entre partes que acertam a posse e o uso de determinado imóvel, mediante o pagamento de determinado valor. Tanto a lei 8.245/91 (lei das locações) quanto os contratos dispõem de regras que regem eventuais desequilíbrios na relação contratual.

Assim, está estabelecida, por exemplo, a ação revisional, que permite após 3 anos, reivindicação (tanto de inquilino quanto de proprietário) junto ao Poder Judiciário de rever as bases da locação, fundadas no real valor do mercado.

A regra geral desses contratos, é fazer com que as partes o cumpram em todos os seus termos. Contudo, há fatos que independem das partes e que podem afeta-las diretamente, produzindo efeitos igualmente diretos no próprio contrato. Se esses fatos são absolutamente imprevisíveis – não pertencendo a tudo quanto pode-se prever no curso de vigência do contrato – e acabam por onerar excessivamente uma das partes.

Daí o mundo jurídico adotar duas teorias de suma importância: a teoria da imprevisão – caso fortuito e força maior – e a teoria da onerosidade excessiva.

Claro que para se invocar o sistema de exceção são necessários que estejam presentes alguns requisitos:
(1) que se trate de contrato comutativo de execução diferida ou continuada;
(2) que, quando da execução, tenha havido alteração das circunstâncias fáticas vigentes à época da contratação;
(3) que essa alteração fosse inesperada e imprevisível quando da celebração do contrato;
(4) por fim, que a alteração tenha promovido desequilíbrio entre as prestações.

(Felipe Quintella – Curso de Direito Civil – Editora Atlas, 2020)

No caso atual, sem nenhuma dúvida o enfrentamento de toda essa realidade imposta pelo coronavírus preenche, incontestavelmente, todos esses requisitos.

Assim, em não havendo algum tipo de acerto, ou transação entre proprietário e inquilino, o judiciário poderá intervir de maneira liminar e o pleito terá como fundamento os seguintes dispositivos do Código Civil Brasileiro:

Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato.
Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.

Dentro das alternativas legais, então, poderia o inquilino pleitear, inclusive (demonstrado o atual estado econômico enfrentado) ou a redução do valor do aluguel em patamares suportáveis proporcionalmente e durante o estado de calamidade pública. Ou, dependendo das circunstâncias, a própria suspensão ou isenção do pagamento do aluguel durante o mesmo período.

Seja uma ou outra solução (revisão ou isenção), o objetivo seria o restabelecimento do equilíbrio contratual.

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